Restaurante da Camila / Espaço da Onça

“O sonho era estar perto do meu filho”, conta Camila Feitosa, 48 anos, nascida e crescida no bairro do Campo Limpo, periferia de São Paulo. Seu filho Davi é uma pessoa com deficiência (PCD) intelectual. “Eu tive vários problemas na infância. Violência doméstica agressões, isso me fez sair de casa cedo’’, diz Camia. Depois de um casamento que não deu certo e já com o filho, ela trabalhou em um supermercado por 8 anos e depois foi faxineira doméstica. Ralando muito, percebeu que valia muito mais a pena ser autônoma e voltou a estudar, mas não conseguia estar perto do filho como gostaria.

A guerreira queria fazer algo diferente, que transformasse sua vida, mas a dúvida se conseguiria estabilidade fazia com que não arriscasse. Então, um amigo que tinha uma lanchonete malsucedida no bairro do Campo Limpo, soube do desejo de Camila de abrir um negócio e ofereceu a ela um trabalho na tal lanchonete, ganhando R$ 800 por mês. “Para mim não compensava, eu tirava muito mais fazendo faxina’’. No dia seguinte, em uma palestra de aperfeiçoamento da carreira profissional, refletiu sobre os conselhos da especialista Ana Raia: “Ela disse que a gente precisava acreditar nos nossos sonhos. Eu não tive dúvidas’’.

Camila é extremamente grata por aquela palestra até hoje. Ao sair da escola, foi conversar com o dono da lanchonete fazendo uma contra proposta: que cedesse o espaço pelo aluguel no valor dos mesmos R$ 800. O espaço era bem pequeno e ficou menor ainda para o número de clientes já do primeiro mês. Após o sucesso, vendeu sua casa no bairro Vila das Belezas e logo encontrou um lugar adequado. “Eu estava realizando o meu sonho, podia tocar o meu negócio perto do meu filho’’.

A casa é modesta. Na parte da antiga garagem, mesas e cadeiras. No corredor, o espaço do self-service, uma TV e uma mesa de vidro redonda. À direita, o banheiro, masculino e feminino, que também serve para a família da Camila. Um pouco mais à frente, a cozinha da Camila; uma cozinha domestica, que conta com um fogão de 8 bocas, um pequeno forno, uma pia e muito amor.

“Eu começo a cozinhar às 06h e às 10h tem que estar tudo pronto, porque começam os pedidos via delivery’’. O almoço inclui arroz, feijão, salada, farinha e alguns molhos. Após o prato montado pelo próprio cliente, à vontade, ele mesmo solicita a mistura, que vem em um pratinho separado. As opções são: contra filé, filé de frango ou linguiça na cerveja. Em média saem 110 refeições por dia. Nas opções de sobremesa, o que faz sucesso é o pudim, preparado pela própria Camila. No local trabalham 3 pessoas, um entregador, um garçom e a chefe.

Camila acredita que seu sucesso na região do Campo Limpo deve-se muito ao amor pelo filho: “Eu acredito no amor que coloco na refeição’’.

Restaurante da Marlene

Cambuci: a palavra que nomeia o bairro do Centro de São Paulo veio de uma fruta nativa da Mata Atlântica. Sua origem é o termo “kãmu-si”, ou “pote d’água” em tupi-guarani, devido à sua semelhança com o formato dos vasos de cerâmica que os índios produziam. O fruto – da família das goiabas e jabuticabas – está diretamente ligado à história do estado de São Paulo, pois, originalmente consumido pelos índios, passou a ser consumido pelos bandeirantes curtido na cachaça.

Apesar da importância histórica e ambiental, pouca gente conhece a fruta e a espécie chegou a ser ameaçada de extinção. Hoje esse quadro vem mudando e o cambuci se tornou um símbolo de preservação da Mata Atlântica, graças a estratégias como a Rota do Cambuci, um festival que teve sua primeira edição em 2009. Parelheiros, no extremo sul da capital, faz parte dessa rota. A 37km de distância do Marco Zero da cidade, na Sé, a região, com seu clima de interior e cercada por toda parte pelo verde da Mata Atlântica, foge completamente do perfil caótico e cinza do resto de São Paulo. É lá que estão localizadas as duas unidades do Restaurante e Pizzaria Marlene, que certamente possuem a melhor e mais sustentável comida caseira da região.

Aberta em 1989, pela Dona Marlene, a primeira casa era inicialmente um bar. Em 2006, ela passou a desenvolver receitas com frutas nativas, que deram tão certo que três anos depois passaram a fazer parte da Rota do Cambuci. O restaurante self-service muda o cardápio todos os dias, de acordo com a qualidade e preço dos produtos na semana. Ainda assim, alguns pratos são verdadeiros clássicos, como a moqueca de peixe, o peixe à milanesa e a espetacular costelinha de porco no molho agridoce de cambuci, que desmancha na boca e combina perfeitamente com o sabor ácido e adocicado da fruta. Vale ressaltar também que todas as ervas e folhas são orgânicas, compradas de produtores da região. O preço é muito camarada e para acompanhar a comida, nada melhor que o suco de cambuci, também ácido e adocicado na medida certa. Uma paleta de cambuci com leite condensado é perfeita para fechar o almoço. Outras delícias caseiras feitas com a fruta também podem ser encontradas no restaurante, como geleias, musses e cachaças.

“Quando comecei, Parelheiros era bem menor, mas não cresceu tanto econômica e culturalmente falando. É preciso de muito trabalho para que os moradores daqui tenham mais contato com as nossas frutas”, diz a simpática Dona Marlene, que abriu a segunda unidade do restaurante em 2015 e também dá oficinas culinárias sobre as frutas nativas em diversos pontos da cidade. Com sua rica simplicidade transmitida tanto na fala, quanto na comida, ela se tornou uma figura importante na divulgação da região. É daquelas pessoas com um jeito gostoso, que dá vontade de colocar dentro de um potinho, ou de uma compota, e levar para casa.

 

 

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